O MOMENTO PROCESSUAL DA CONCORDATA SUSPENSIVA

Existem a disposição do comerciante institutos para evitar a bancarrota. O primeiro deles é a Concordata Preventiva: o segundo é a Concordata Suspensiva.

Inicialmente, consigne-se a busca da identificação da natureza jurídica da concordata, quer preventiva quer suspensiva. Pela Lei anterior, como salienta Soares de Faria,era tida como acordo (arts.104, n. 3), em todas as fases, da proposta do devedor (art.103 e 104); da aceitação dos credores (arts. 106 e 155) e à rescisão (arts. 115 e 58 ). No entanto, pela Lei atual, pode-se afirmar: trata-se de ato processual.

Várias são as teorias a respeito da natureza jurídica, da contratual à processual, da contratual legal à obrigação legal. Extremamente didática é a analise individual de cada uma delas, mas os argumentos que apresentam, unitariamente, são consistentes e não há demérito em se defender uma das posições.

De se indagar o conteúdo das normas falitárias sob os aspectos processuais e substantivos . A questão é saber quais as esferas de abrangência de cada uma. Em linhas mestras pode-se afirmar ter índole substantiva ou material, as normas sobre o estado falitário, e os efeitos jurídicos, os direitos, preferências e obrigações da parte. A parte processual engloba as normas sobre o andamento do feito, as formalidades e os recursos.

A lei falitária, ex vi art. 178, determina que o requerimento da Concordata Suspensiva somente pode se efetivado nos “cinco dias seguintes ao vencimento do prazo para entrega, em cartório, do relatório do síndico (art. 63, XIX )”. Ultrapassada esta oportunidade,a qualquer tempo o falido poderá interpor o favor, mas sem interromper a realização do ativo (art.185). Os prazos fixados na lei falencial são exíguos, contínuos (art. 204) e rigorosos. Portanto sob este prisma é que se deve interpretar a lei.

O texto legal, via de regra, não contém dispositivos e palavras inócuas, além do que deve ser interpretado à luz do interesse social (art.5º Lei de Introdução ao Código Civil). Há duas formas de interpretar o art. 178 da Lei de Falências. A primeira, com rigor posicionando-se no sentido de que, somente após a efetiva apresentação do segundo relatório pelo síndico (art. 63, XIX) é que há prazo para impetrar tal favor legal; outra, utilizando-se da equidade jurisprudencial, com o crime falimentar, admitindo-se a concessão via contagem dos prazos processuais.

A primeira forma é a mais pacífica, na medida em que há determinação legal acerca do tema. Quanto a segunda, recorda-se que a jurisprudência visa exatamente interpretar, efetivamente, a lei à realidade social.

A equidade e analogia podem e devem ser aplicadas, especialmente quando relacionadas com o crime falimentar, por serem matérias afetas ao mesmo tema básico. O art.199 e seu parágrafo único fixam prazo de dois anos para a prescrição, contados do trânsito em julgado da sentença de encerramento da falência.

Ora , inexistindo o trânsito em julgado, inexistirá a prescrição? Grande controvérsia surgiu sobre o tema especial pela dicotomia entre os prazos legais e a realidade forense, infelizmente. A Súmula 147 do Pretório Excelso extinguiu a controvérsia , fixando, jurisprudencialmente, o prazo de dois anos para encerramento da falência, contados da quebra , eis que estimou-se em dois anos como o lapso temporal para o enceramento do processo falitário. Assim, nada impede que se aplique interpretação semelhante entre o lapso de encerramento da falência ao do prazo previsto no art. 63 XIX e o disposto no art. 178.

A conjugação desta situação levaria a uma fixação, idealística, do prazo de apresentação do segundo relatório, que é obrigação do síndico, ensejando a oportunidade do pedido de suspensividade da quebra de forma mais próxima.

Reitera-se: o momento processual para interpor o pedido de Concordata Suspensiva é aquela fixado pela própria lei, isto é , “cinco dias seguintes ao vencimento do prazo para a entrega, em cartório, do relatório do síndico”. A Lei fixou como “vencimento do prazo” e não da entrega efetiva.
Ora, fazendo-se um sumário simplista dos prazos falitários, da quebra até o segundo relatório, tem-se, aproximadamente, 180 dias.

È neste instante que se processa o vencimento do prazo ao síndico para entrega do relatório e não antes ou depois, pois se houve descumprimento dos prazos processuais, independente da responsabilização dos interessados e partícipes, não pode o falido ser prejudicado em seus direitos.

A evidência que se o relatório for entregue antes deste tempo, o momento será a partir da entrega.
O comerciante honesto que sofre as agruras da falência, mas com capacidade suficiente para reerguer-se, pode e deve pleitear a suspensividade da quebra. O fato de ser procedimento relativamente raro nos meios forenses , com reduzida doutrina e jurisprudência,não elide a sua legalidade e viabilidade.

Até porque o Dec, -lei 858/69 determina a suspensão da correção monetária nos débitos fiscais durante um ano contado da quebra, com o pagamento sendo realizado pelo valor constante à data da quebra, se efetivado nos trinta dias subseqüentes ao vencimento do prazo anuo ,sob pena de incidência plena, inclusive abrangendo o período de suspensão. A lei falitária fixa, como único impedimento ao pedido da Concordata Suspensiva o recebimento de denúncia ou queixa (art.111); os demais elementos são processuais.

Perante a 1ª Vara Cível da Comarca de Itu houve deferimento de Concordata Suspensiva de forma sui generis, eis que,em concordata preventiva convolada em quebra foi pleiteada a suspencividade , que restou deferida, com apresentação de garantias reais por terceiros , além do falido haver proposto o pagamento integral da obrigações, em duas parcelas anuais, tudo sob o fundamento de que o interesse dos credores e da sociedade fala mais alto que o texto frio da lei, até porque a Lei não veda, em instante algum, o deferimento fora do prazo e com pagamento em percentuais maiores que os nela previstos.

Portanto, a conclusão inequívoca é que a Concordata Suspensiva pode ser interposta antes do segundo relatório do síndico (art. 63 XIX), a qualquer instante, bastando haver lapso temporal superior à 180 dias contados da quebra, na medida que este lapso temporal é que é o fixado em lei, como o devido para o Judiciário atingir um pleno estágio de processamento para identificar a prática de eventuais crimes a impedir a interposição da suspensividade.

A omissão judicial não pode causar prejuízos ao falido e, havendo garantias reis efetivas de sorte a respaldar o pedido de suspensividade da quebra, acredita-se que o Judiciário deve decidir favoravelmente a pedidos de Concordata Suspensiva em prazo até inferior ao de 180 dias, eis que é preferível uma Concordata do que a liquidação resultante da quebra (RT 234/284 e 527/92 ), em especial porque, nestes casos específicos , em nada obsta a realização de verificação aprofundada da situação, inclusive com avaliadores e perícia contábil, além da intervenção, obrigatória , do Ministério Público.

Portanto o momento processual para interposição da Concordata Suspensiva é de 180 dias, contados da quebra, eis que este é o prazo resultante de todos os prazos concedidos, para a prática dos atos necessários à apresentação, pelo Síndico, do seu segundo relatório. Permite, ainda, fruto da recuperação econômica, a quitação de todos os encargos tributários sem atualização monetária , o que em regime de economia inflacionário, pode ser realizado com relativa facilidade.

Estas observações são realizadas considerando-se o pagamento em duas parcelas (art.177 parágrafo único II), eis que sendo a vista o pagamento dar –se- á nos 30 dias seguintes ao trânsito em julgado da decisão concessiva (art.183), o que não implica em atualização monetária dos tributos, se dentro do prazo anual.

PUBLICADO NA REVISTA DOS TRIBUNAIS 692/202

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